quinta-feira, 18 de junho de 2015

Após barbárie, colégio onde vítimas de estupro estudavam muda rotina

Pais de alunos acompanham os filhos na entrada e saída da escola.
Amiga das vítimas mudou de turno na escola após o crime.

Gilcilene AraújoDo G1 PI, em Castelo do Piauí
Faixa com palavra luto foi anexada em frente a escola das garotas em Castelo (Foto: Gilcilene Araújo/G1)Faixa com palavra luto foi anexada em frente a escola das garotas em Castelo (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
A rotina dos alunos da Unidade Escolar Francisco Sales Martins, em Castelo do Piauí, mudou depois que quatro garotas, sendo três delas colegas de classe, foram agredidas, violentadas e arremessadas do alto do penhasco com cerca de 10 metros de altura.
Mais de 20 dias depois, a tragédia ainda mostra suas marcas. Inconsolável, a turma na qual estudavam três das vítimas mudou de sala. Com medo, os pais agora deixam os filhos na porta do colégio, onde o clima de luto é evidenciado por um aviso na fachada.
Uma das vítimas, Danielly Rodrigues, de 17 anos, morreu 10 dias após o crime. Das três sobreviventes, uma ainda está internada Hospital de Urgência de Teresina (HUT), e, segundo os médicos, não corre risco de morte. As outras duas tiveram alta e estão na casa de familiares.

Cinco pessoas são suspeitas da série de atrocidades cometidas contra as meninas. Um traficante de 40 anos, que estava foragido da Justiça de São Paulo, foi preso sob suspeita de ser o mentor da barbárie. Entre os investigados, estão quatro adolescentes, também entre 15 e 17 anos, que foram apreendidos horas após o crime. Dois deles confessaram.

O grupo foi denunciado pelo Ministério Público que pediu pena de 151 anos para o adulto e aplicação de medida socioedutiva, no Centro Educacional Masculino (CEM), para os garotos.
Amigas mudou de turno na tentativa de diminuir o sofrimento (Foto: Gilcilene Araújo/G1)Amiga mudou de turno na tentativa de diminuir o sofrimento (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
Três das quatro garotas estudavam na mesma sala, cursavam o 3º ano do ensino médio, e, de acordo com relato de professores, o grupo formado por mais uma adolescente se destacava na classe. A ausência delas é sentida por todos.

Uma das amigas mudou de turno na tentativa de diminuir o sofrimento ocasionado pela falta das colegas. No dia do crime, a estudante, que pediu para não ser identificada, recebeu o convite para ir, junto com as vítimas, até o Morro do Garrote, mas naquele dia preferiu ficar em casa. A garota que retornou para a escola somente na terça-feira (16), 19 dias após o crime, se emociona ao falar da convivência com as amigas.
“Não dava para continuar na mesma classe porque tudo lembra elas. Sentávamos todas próximas e fazíamos trabalhos juntas. Chegar à sala e não vê-las é muito difícil, por isso pedi para mudar de turno. Na nova classe, eu tento assistir às aulas normalmente, mas está difícil”, afirmou.
Jovem escreve no pedaço de papel qualidade das amigas (Foto: Gilcilene Araújo/G1)Jovem escreve no pedaço de papel qualidade das
amigas (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
A jovem Danielly era uma das amigas mais próxima. Descrita com animada e estudiosa, a adolescente morreu 10 dias após o crime. "E de todas, a Dani era a mais organizada. Era a que se cobrava a perfeição nos trabalhos da escola. Nós tínhamos ela como nossa líder por ser destacada, alegre e brincalhona", afirmou.
Uma das escadas da unidade escolar, que era o canto preferido das garotas durante o recreio, agora é evitada para não trazer lembranças. “Não quero olhar para a escada porque sempre ficávamos conversando lá”, disse.
Emocionada, a garota pede para encerrar a entrevista, mas antes escreve num pedaço de papel as qualidades das amigas vítimas do crime que chocou o país (imagem ao lado).

Com a tragédia de Castelo, o clima de medo também faz parte do cotidiano dos moradores da pequena cidade. Segundo a diretora Lucineide Silva, depois do crime, os pais passaram a acompanhar os filhos durante a chegada e saída da escola.
“Nosso corpo discente é formado por adolescente e jovens que antes vinham sozinhos, mas, agora, muitos pais estão vindo deixar e pegar os filhos com medo da violência”, contou.
Alunos da Escolar Francisco Sales Martinsem Castelo continuam amedrontados,diz diretora. (Foto: Gilcilene Araújo/G1)Alunos da Escolar Francisco Sales Martinsem Castelo continuam amedrontados (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
Outra mudança que ocorreu na escola foi a transferência dos alunos do 3º ano para outra sala. A diretora comentou que a decisão aconteceu para estimular o retorno dos alunos, após a barbárie. “Também fizemos isso para evitar os comentários dos amigos de classe. Não queríamos ver eles apontando o local onde elas sentam”, disse.

Vinte um dia após o crime, o clima de tristeza ainda é presente da escola. Além da faixa com a palavra luto continuar no muro da escola, a mesma expressão foi escrita em várias cadeiras da instituição de ensino.

Lucineide Silva pediu ajuda para a Secretaria Estadual de Educação, que realizou uma reunião na terça-feira (16) visando um planejamento estratégico para enfrentar o trauma vivido. “Vamos organizar palestras e encontros com os pais. Professores e psicólogos vão unir forças para ajudar pais e alunos a superar o medo e a dor”, finalizou.

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